Alguns textos bíblicos podem ser de difícil interpretação devido a forma como foram traduzidos.
Entre esses textos, está "Jeremias, Capítulo 48, Versículo 11. Vejamos:
Jer.48.11 - Despreocupado esteve Moabe desde a sua mocidade, e tem repousado nas fezes do seu vinho;
não foi mudado de vasilha para vasilha, nem foi para o cativeiro; por isso conservou o seu sabor, e
o seu aroma não se alterou.
Confuso? Nem tanto! Mas considerando que alguns grupos cristãos (pseudos) tomam textos bíblicos isolados e deles já introduzem na igreja uma doutrina nova, não é difícil que alguém faça uso desse texto para criar uma doutrina baseada em cheirar e comer fezes, pura ou com vinho, alegando que, como o texto menciona o aroma e o sabor das fezes de Moabe, pode-se entender que eles cheiravam e comiam suas fezes.
NOTAS #1 - Dicionário Priberam da Língua Portuguesa:
fezes: (s. f. pl.) - Substantivo feminino plural
fe·zes
(latim faex, -cis, borras, resíduo, sedimento)
1. Resíduo sólido ou pastoso de um líquido acumulado no fundo de um recipiente. = BORRA, DEPÓSITO, LIA, PÉ, SEDIMENTO
2. A escória dos metais.
3. [Medicina] Matérias fecais. = EXCREMENTO
NOTAS #2 - Dicionário Aurélio - 6a. Edição - 2006
fezes:1. Borra; 2. Matérias fecais; 3. Escórias metálicas.
O texto, em todo o seu conteúdo, está rigorosamente correto. O fato é que o vocábulo "fezes" tem outros significados além do que se entende a primeira vista.
Conforme o exposto, o profeta está comparando o povo de Moabe a um vinho que não foi completamente elaborado, e que ainda conserva o cheiro e o sabor da borra da uva, que é um resíduo que fica sedimentado no fundo do recipiente..
O que o texto realmente expressa?
Moabe era um povo que habitava na região sudeste da Transjordânia, (Ver mapa), e seus indivíduos eram chamados de moabitas.
Moabe era o nome do seu patriarca de quem eram descendentes.
A região na cor "vinho" era o reino de Moabe. Note mais acima, a região em cor abóbora era o reino de Amom, irmão de Moabe. Ambos filhos de Ló. A região em cor amarela, ao sul, era o reino de Edom (Esaú), irmão de Jacó, (Israel).
Podemos notar a oeste, em vermelho, a região dos "estados filisteus", hoje Palestina.
Esse Moabe era irmão de Amon, ambos filhos de Ló, o sobrinho de Abraão. Ló os gerou de suas próprias filhas depois de
sair de Sodoma, passar por Zoar e habitar em uma caverna no monte. Tempos depois, os descendentes de Moabe
ocuparam as terras de um povo chamado "emins". (Dt. 2:9-11). Moabe era filho da filha mais velha de Ló, e o filho da filha
mais nova chamou-se Ben-Ami, que é o pai dos Amonitas.
O texto, no inicio, faz uma comparação entre Moabe e Israel. Enquanto Moabe esteve sempre tranqüilo, proprietário das terras onde foi gerado, Israel nunca teve um lugar próprio para habitar. Moabe nunca foi para o cativeiro, enquanto Israel foi escravo no Egito, dando a entender que Israel esmerou-se com as peregrinações e o cativeiro, e Moabe sempre esteve tranquilo no seu canto, e vivia como nos séculos passados. Não evoluiu socialmente.
Desde o princípio entende-se que Deus tinha um propósito com os moabitas. Ele já estava preparando o território onde Israel habitaria mais de 600 anos depois, colocando ali povos visinhos amistosos ou aliados. Como o patriarca Ló era sobrinho de Abrão, os descendentes de Ló, moabitas e amonitas, eram parentes dos descendentes de Abrão, como era toda a nação de Israel.
Os moabitas, como também os israelitas, sabiam disso. Contudo os moabitas tomaram outro rumo, não seguindo as diretrizes estabelecidas por Deus. Vejamos:
Quando os israelitas chegaram na região, tomaram várias cidades e nelas habitaram, e tornaram-se visinhos dos moabitas. Conforme citado em Dt.23:3-6 e Num.13:1, 2 os moabitas tornaram-se participantes da congregação de Israel. Entenda-se por congregação não somente o ajuntamento do povo para um evento religioso, mas também no seu cotidiano.
Então Balaque, o rei de Moabe, ficou alarmado e temeu muito e não procurou armistícios pois os considerava inimigos. Ao invés disso, contratou a Balaão, esperando enfraquecer os hebreus através de maldições que seriam proferidas pelo profeta de Deus. Como o próprio Balaão sabia que isso não funcionaria, e desejando o prêmio das mãos de Balaque, sugeriu algo que realmente funcionaria. Por sugestão de Balaão os moabitas seduziram os israelitas para a idolatria e licenciosidade (Nm 22-25). Por causa disso, os moabitas foram excluídos da congregação de Israel até a 10ª geração e foi dito a Israel que se mantivesse longe deles (Dt 23:3-6; Nm 13:1, 2).
Ora, não havia necessidade de nada disso, pois Deus mesmo tinha dito a Moisés que não molestasse os moabitas como também os amonitas, ambos descendentes de Ló, pois a eles tinha dado aquela terra. Deut.02.17-19. Então bastava a Balaque apenas um pouco de sabedoria e humildade para negociar isto com Moisés. Com isto, além de não ser importunado teria um aliado fortíssimo. Faltou visão de Deus à Balaque, pois era somente seguir as diretrizes de Deus que tudo terminaria bem. Mas eles não fizeram assim.
Vejamos como o profeta Jeremias se expressa no versículo anterior:
Jer.48.10 - Maldito aquele que fizer a obra do Senhor relaxadamente, e maldito aquele que retém a sua espada
do sangue, ou seja, os moabitas tinham uma obra de Deus para fazer, e a fizeram de maneira desleixada, deixando de
cumprir o propósito para o qual Deus os tinha criado. Ficaram na contramão. Ao invés de se colocarem ao lado
de Israel, colocaram-se contra.
O que eles fizeram de errado? Jer.48.27 diz: Pois Israel não te foi também objeto de escárnio? Mas, acaso foi achado entre ladrões, para que meneies a cabeça falando dele?
Assim, eles desprezavam e desconsideravam Israel, que para eles era objeto de zombaria.
Em Jer.48.29 diz: Ouvimos falar da soberba de Moabe, que de fato é extremamente soberbo; da sua arrogância, do seu orgulho, da sua sobranceria e da altivez do seu coração.
Então em outras palavras, o texto do versículo 11 em questão diz:
Os moabitas não se esmeraram. Não se aprimoraram. Desde que foram criados ficaram como eram. Não melhoraram em nada. Não mudaram em nada.
Não fizeram caso dos planos de Deus para suas vidas, e seguiram os seus próprios caminhos.
Como o vinho, que fica na própria cuba onde as uvas foram amassadas, sem passar para as outras cubas que
refinam o seu sabor e o seu buquê.(ver ilustração)
Diferente de Israel, que aprimorou-se através do cativeiro e do êxodo, mas recaiu depois. Isto nos leva a entender que o aprimoramento da personalidade e dos sentimentos vêm do exercitar-se através de lutas e tribulações, como está escrito:
Romanos 5:
3 - E não somente isto, mas também nos gloriamos nas tribulações; sabendo que a tribulação produz a paciência,
4 - E a paciência a experiência, e a experiência a esperança.
(Seleção e comentários dos textos bíblicos: Pr. Walter Vaccaro).
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